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Impactos conflitantes: as novas regulações de mineração e o aumento do garimpo ilegal na Amazônia

Publicado em 20/05/2024

Como o PL 957/2024 pode influenciar a dinâmica do garimpo ilegal e o futuro ambiental e social da Amazônia

Por Dr. Ramon Rosa

Top View of a Mining Site⁠ – Feito por Tom Fisk de Pexels

O setor de mineração do Brasil, crucial para a economia nacional, está prestes a sofrer uma transformação significativa com o Projeto de Lei 957/2024, proposto pelo deputado Filipe Barros. O referido projeto visa reformular o Código de Mineração de 1967 para adaptar a legislação às novas demandas econômicas e tecnológicas, tendo como principal proposta a centralização da administração mineral pela União, de forma a agilizar os processos de licenciamento e a reduzir a burocracia.

A Amazônia, uma região vital para a biodiversidade global, enfrenta um aumento do garimpo ilegal, causando devastação ambiental e violações dos direitos das comunidades locais e indígenas. Neste sentido, a proposta do PL 957/2024, embora tenha o objetivo de modernizar o setor minerário, levanta preocupações significativas sobre a diluição dos padrões ambientais e de consulta comunitária. O afrouxamento dos critérios de licenciamento pode facilitar inadvertidamente o garimpo ilegal, exacerbando os conflitos ambientais e sociais na região.

A centralização da administração mineral trazida pelo PL 957/2024 pretende uniformizar os processos de licenciamento e fiscalização pela Agência Nacional de Mineração (ANM), podendo resultar em uma gestão mais eficiente e menos suscetível a discrepâncias regionais. No entanto, a redução nas avaliações ambientais detalhadas e a simplificação dos processos podem comprometer a capacidade do governo de monitorar e controlar os impactos ambientais da mineração. Documentos como o relatório sobre a ‘Nova Corrida do Ouro na Amazônia’ (Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 2024) destacam os impactos devastadores do garimpo ilegal, incluindo desmatamento massivo, contaminação de rios com mercúrio e perda de biodiversidade.

As comunidades locais, especialmente as populações indígenas, podem enfrentar maiores riscos de deslocamento e outros impactos negativos devido à facilitação das atividades de mineração. A menor ênfase em consultas públicas e participação comunitária no processo de licenciamento pode exacerbar esses problemas, levantando questões de justiça social e direitos humanos. É fundamental, portanto, que as novas regulamentações promovam não apenas a eficiência econômica, mas também a proteção ambiental e social. Isso inclui o fortalecimento das capacidades de fiscalização da ANM, o estabelecimento de critérios rigorosos para a avaliação de impacto ambiental e a garantia de transparência e participação pública nos processos de licenciamento.

A modernização da legislação minerária brasileira por meio do PL 957/2024 representa um momento crucial. A Constituição do Brasil estabelece o meio ambiente como um bem de uso comum do povo, devendo ser defendido e preservado para as presentes e futuras gerações. Além disso, o Brasil é signatário de tratados internacionais de direitos humanos e de proteção ambiental, que reforçam a necessidade de legislações nacionais que promovam a eficiência econômica sem comprometer a proteção dos direitos humanos e do meio ambiente.

O sucesso das políticas ambientais e de proteção aos direitos comunitários depende da capacidade de fiscalização do Estado, incluindo recursos adequados para a ANM e órgãos ambientais. Garantir que as comunidades afetadas tenham voz ativa em todas as fases dos projetos de mineração é essencial para assegurar que sejam cumpridos seus requisitos legais, além do respeito aos direitos e necessidades locais. A implementação de processos decisórios transparentes e inclusivos é fundamental para construir uma política minerária produtiva e justa.

O PL 957/2024 deve ser meticulosamente analisado para garantir que suas disposições não contrariem os compromissos constitucionais e internacionais do Brasil. As medidas para simplificar o processo de licenciamento devem ser cuidadosamente projetadas para não diminuir os padrões de proteção ambiental, incluindo garantias robustas de proteção aos direitos das comunidades (indígenas e locais) e assegurando compensações justas e benefícios compartilhados.

Por fim, cabe destacar que reforma do Código de Mineração, proposta pelo PL 957/2024, terá implicações duradouras para o legado de sustentabilidade e justiça social do Brasil. Um quadro legal bem balanceado será essencial para assegurar que o país possa continuar a explorar seus recursos minerais de maneira que beneficie economicamente o país, enquanto protege seus recursos naturais e populações vulneráveis. Esta legislação será decisiva não apenas para a saúde econômica do Brasil, mas também para sua integridade ecológica e coesão social.

*Ramon Rosa é advogado responsável pelo Deptº Jurídico do Instituto Brasileiro de Gemas e Metais Preciosos